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domingo, 8 de abril de 2012

NÊGO-MALUCO


"Nêgo, meu bem, Você já está de saída?” – perguntou a esposa ao marido, um descendente de japoneses que não conhece o Japão e não tem a menor vontade de conhecer. “Sim, querida! E já estou um pouco atrasado” – respondeu. Não tem a menor importância contar aqui para onde Nêgo estava indo, mesmo porque jamais chegara ao seu destino. Rodou poucos quilômetros até descobrir que estava sendo seguido por outro carro. “Pare este carro agora meu chapa!” – ordenou um dos homens encapuzados do veículo que estava aparelhado ao carro de Nêgo. “Não posso, estou atrasado para um compromisso” – retrucou o abnegado nissei, totalmente alheio ao perigo da situação. “Ah é, pistoleiro! E vai ficar mais atrasado ainda com as balas que eu pretendo enfiar nos teus miolos se você não parar esta porcaria agora!” – disparou o fugitivo. Nêgo então percebeu o que estava acontecendo. “Valha-me Deus, um sequestro!” – pensou. Parou o carro no meio da avenida e, muito assustado, depois de uma freada brusca, permaneceu atônito ao volante. Quatro sujeitos mal encarados saíram do carro em fuga, arrancaram Nêgo de seu veículo e o enfiaram dentro do deles. “Anda, some daqui com este carro agora!” – ordenou um dos bandidos. Nêgo obedeceu prontamente. Já que não havia outro jeito, resolveu voltar para casa. Só não contava mesmo com a escolta de um helicóptero da polícia. “Puxa, nunca mais vou reclamar da polícia! Nem precisei ligar para o 190” – pensou. Mal entrou na garagem e deu de cara com a esposa ajoelhada no gramado do quintal, com as mãos espalmadas para o alto. O vento que vinha do helicóptero era tão forte que fazia com que o rosto da mulher se esticasse para todos os lados e em todas as direções, lembrando ondas do mar que vão e que vêm, numa velocidade alucinante. “Pelo amor de Deus, não atirem!” – gritava enlouquecida. Depois de muito vento, barulho e gritaria, o helicóptero pousou no gramado. Dois policiais desceram e deram ordem de prisão ao casal, completamente esbaforido. Pois bem, depois de muita conversa, tudo ficara esclarecido e os dois foram liberados. O fato é que bandidos em fuga roubaram um primeiro carro. Depois de um tempo, trocaram com o carro de Nêgo, este perdido em uma capotagem cinematográfica. No total, os meliantes conseguiram dar a volta na polícia utilizando seis veículos, conseguindo finalizar a fuga, com sucesso, com o último. Na delegacia, os seis donos dos veículos roubados deram seus depoimentos ao delegado. “Ah, então era você que estava com o meu carro?” – disse o proprietário de um dos veículos roubados, assim que ficou frente a frente com Nêgo. “Exatamente” – respondeu. “E quero aproveitar a oportunidade para te dar um conselho: compre um carro mais potente, porque o seu carro é um pé-de-boi, somente assim outros motoristas não correrão o risco que eu corri” - deu de ombros e voltou-se para a esposa: “Querida, vamos para casa e esquecer toda essa loucura”. “Mas, e o compromisso meu bem?” – perguntou-lhe. “Pois é querida, essa estória toda serviu para eu descobrir que estar vivo é melhor que qualquer compromisso” – finalizou. O casal chamou um táxi e retornou para casa levando a impressão de uma nova vida.

 Éd Brambilla. Crônica. NÊGO-MALUCO. 2012.

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