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quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

PEQUENO CAIO: O MENINO-PÁSSARO

Para compor este conto, eu precisei "escreler" o livro "A história de Fernão Capelo Gaivota", do escritor americano Richard Bach. Sim, eu "escreli", porque se tivesse digitado, eu teria "digilido". E assim o fiz por considerar a forma mais íntima e pessoal de mergulhar verdadeiramente em uma história que pedia para ser vivida. Eu vivi o drama; fui o próprio Fernão Capelo Gaivota. Escrevi cada palavra - a próprio punho - com caneta de tinta azul. Mas não é de mim que esta história, formada a partir de uma experiência pessoal, quer falar; mas de um menino que veio ao mundo para ensinar a compreensão, a humildade, o desapego, e, acima de tudo, o AMOR, àqueles que, de alguma forma, foram privilegiados por fazer parte de sua breve e iluminada passagem por esse mundo. Caio é seu nome; e gigante foi sua luta. Assim como Fernão Capelo Gaivota, ele também precisou ir além porque tinha necessidade da verdadeira liberdade. Vou chamá-lo de Menino-Pássaro, por tratar-se de uma história de superação e libertação, pois ainda não inventaram uma palavra comum para definir o significado de sua luta. É com a mais pura liberdade que conto esta história de tão puro amor: a história de um Menino que salvou sua Mamãe. Ela não entendia o verdadeiro sentido do amor porque nunca haviam lhe ensinado; e a tristeza precisava dar espaço para a alegria. Então a Mamãe rezava todos os dias para que o Deus lhe enviasse um sentido para a vida. Pesaroso com suas preces, o Deus lhe enviou um anjo com a missão de lhe ensinar o amor. Mas o amor verdadeiro exige sacrifícios, e, nesta história, o sacrifício maior é de reciprocidade que comove: o bebê chegou trazendo consigo a encenação da partida; era preciso coragem para suplantar a anormalidade do que é corpóreo. Assim, Bebê e Mamãe promoveram uma simbiose. Com as almas entrelaçadas, viveram o mais lindo encantamento. Caio, o Menino-Pássaro, nascera fisicamente perfeito, em vinte de dezembro de dois mil e quatro; com dois meses de vida, acometido por problemas que comprometeram sua coordenação motora, transformara-se em uma criança especial, tornando-se fisicamente dependente; a Mamãe tornou-se a extensão de seu frágil corpo. No entanto, sua alma era de uma imensidão que assombrava até mesmo o mais cético dos médicos. Pequeno Caio sentia o amor que recebia de uma forma tão incontestável que, mesmo com tantas internações em U. T. I., remédios que o levavam a outros problemas, traqueostomia, gastrostomia e fisioterapia, permanecia ao lado de sua Mamãe sem manifestações de dor ou cansaço; mantinha uma serenidade e um brilho no olhar como um guerreiro que sabe de sua real missão: ensinar coragem e valor à vida. Para que o leitor absorva melhor a essência desse Menino-Pássaro, transcrevo, a seguir, um poema para melhor defini-lo:

Pequeno Caio

Os meus olhos são a minha boca,
O meu olhar a minha fala.
A minha fala são os meus pensamentos,
Os meus pensamentos o meu mundo.
O meu mundo é o meu corpo,
O meu corpo a casa de minh’alma.
A minh’alma são os meus limites,
Os meus limites o meu amor.
O meu amor é traduzido por ternura,
A ternura o afago de minha mãe.
Minha mãe é o meu anjo protetor,
O meu anjo protetor o Meu Deus.
O Meu Deus é a minha fé,
E a minha fé não tem tamanho.
E o meu tamanho é do Tamanho de Deus.

Caio comunicava-se com a alma, através do olhar. Ensinou para as pessoas que com ele conviveram, o que cada uma precisava aprender; o dinheiro perdeu a importância para àqueles que o consideravam essencial; a perfeição estética deixou de ser meta para os vaidosos; a depressão tornou-se insignificante aos olhos dos melancólicos. Caio tivera todos os motivos para abandonar a batalha, mas preferiu lutar; manteve suas frágeis mãozinhas agarradas a cada fio de esperança; sugou humildemente cada gota de vida que lhe fora permitida. E assim o fez - mais por sua Mamãe do que por si próprio - até terminar sua missão. Quando sentiu que sua Mamãe crescera em amor e espiritualidade suficientes para caminhar sozinha, calou-se e deixou que o Deus decidisse o seu destino. Aos poucos, foi despedindo-se de sua Mamãe. Ela sabia que estava chegando o dia de seu pequeno anjo partir através de complicadas manifestações físicas que aumentavam a cada momento. Mesmo assim, o Menino mantivera-se sereno. Em cinco de julho de dois mil e oito, às 22h30, Mamãe entrou na U. T. I. para dizer ao Valente Pássaro que estava pronta para separar-se dele fisicamente. Os dois tiveram uma conversa secreta. Às 02h00 - já era domingo -, Mamãe foi à capela do Hospital para agradecer ao Deus o anjo enviado, e que, naquele momento, estava a devolvê-lo ao seu verdadeiro lar. Terminada a prece, saiu da capela rumo a U. T. I. Quando chegou à porta da grande sala, uma enfermeira a aguardava. Não houve um diálogo de palavras entre as duas, mas apenas de olhares e expressões. E foi dessa maneira que a enfermeira comunicou a Mamãe que o Pequeno Pássaro havia alçado voo, às 02h45. A tranqüilidade de seu voo pode ser experimentada no poema ADEUS:

Escolhi o domingo para me despedir
Quis o sol para que houvesse calor
Quis o céu azul, da cor da simplicidade
Não era primavera, mas as flores vieram me saudar
Elas deixaram o dia perfumado
O dia ficou com o cheiro da paz
Meus amigos vieram todos me desejar uma linda viagem
Em cada adeus deixei uma benção
Em cada benção deixei um pouco de minha energia
Em cada coração plantei uma semente de coragem
Também havia música, bastava fechar os olhos e ouvir
Eram notas de harpas
E o anjos? Ah, como eram esplendorosos!
Foi um dia de comunhão
Foi um dia de adeus
Mas também foi um dia de libertação
Agora sou luz de Deus
Agora sou vida em movimento
Agora sou a doce lembrança do frescor da manhã
Que dia lindo Meu Deus! Que dia lindo!
E aqui fica o meu Adeus!


Foi desfecho de grande luta a conquista de liberdade entre Pequeno Caio e sua Mamãe, e esta, agora, conduz sua porção de mundo com magistral sabedoria; vive intensamente cada momento de sua vida; aprendera a buscar o que realmente vale a pena; a suplantar problemas, agora insignificantes, se comparados a esse valente Menino-Pássaro, Menino-Anjo, Menino-Amor; e ela leva em seu coração a energia renovadora de um amor encantado. Voa Pequeno Pássaro; Vá em busca do teu pedacinho de céu; Viaja no tempo e rebusque tua verdade; Voa mansinho e encontre em Deus a tua verdadeira felicidade.



Éd Brambilla. CONTO. PEQUENO CAIO: O MENINO PÁSSARO. 10/10/2010.


2 comentários:

Unknown disse...

Pequeno Caio, o pássaro da minha vida... <3

Unknown disse...
Este comentário foi removido pelo autor.