Teria sido mais um dia como outro
qualquer na cozinha se não fosse o tal pino de segurança da panela de pressão.
Como de costume, eu ia fazendo tudo ao mesmo tempo: lavando o que ia sujando de
louça, refogando o arroz e cortando os legumes. E a panela lá... Só esperando o
momento certo para se rebelar. Alguns minutos depois, assim que “pegou
pressão”, o pino vermelho voou e a panela se pôs a esguichar o que tinha de
líquido dentro dela como se fosse um potente “Geisel”. Vejam que ousadia, uma
panela com alma de “Geisel”! O meu primeiro impulso foi o de cravar o pino de
volta no orifício de onde nunca deveria ter saído. E fiz isso com a mão direita
completamente nua; e juro que não senti nenhuma dor. Eu teria conseguido
resolver o problema se não fosse o fato de minha irmã, trajando apenas calcinha
e camiseta, feito uma ensandecida correndo de uma bala perdida, não tivesse
passado como um foguete em direção à porta da sala que dá acesso ao corredor
social do prédio, este monitorado por câmeras de segurança. E atrás dela,
Lilica & Leleca, as yorks, correndo e gritando feito umas doidas também.
Eu, desorientado que sou, imaginei que o quarto delas (de minha irmã e das
yorks, minha gente) estivesse desabando. Não pensei duas vezes, soltei o pino
e sai correndo atrás de todo mundo, aos berros. Quando descobri que era a
panela o motivo daquele desespero todo, inclusive o meu, embora eu não soubesse
que o era, voltei para a cozinha - meio cabreiro - e desliguei o fogo. Esperei
até que a panela desafogasse toda a sua revolta (na verdade, acredito que seja
mágoa o que ela estava sentindo; e tenho certeza que foi depois que ela me
ouviu dizer para uma outra irmã, que já estava na hora de trocá-la) e, quando
restaram apenas umas tossidas fracas de doente prestes a deixar o corpo,
peguei-a pelo colarinho e a coloquei dentro da pia, com a torneira aberta. Uma
chuveirada fria sempre é bom para curar histeria. Passado o susto, tudo voltou
ao normal, inclusive a panela de pressão, que voltou para o fogo para terminar
o que ela sabe fazer melhor que qualquer outra panela: cozinhar o feijão. E
deixei bem claro que eu não toleraria outra pirraça. Mostrei a ela que não
tenho medo de revoltas. Quanto a minha irmã, adverti: o porteiro da noite com
certeza divertiu-se muito com a sua correria, sem contar que deve ter ficado
maravilhado com a sua “bunda”.
Éd Brambilla.
Crônica. A REVOLTA DA PANELA DE PRESSÃO. 16/09/2014.
Um comentário:
Belíssima descrição de um caos... que acontece com um em cem. Fico pensando que cem milhões... rs... E, é tão apavorante, quanto patético. Parabéns, estive de espectadora, com tamanha desenvoltura na sua escrita.
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