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domingo, 3 de fevereiro de 2013

INVERSÃO PARA REFLEXÃO



E, de repente, o mundo girou, girou. E assim reposicionou-se: uma mulher e sua companheira assistem estupefatas, a uma notícia no telejornal: “- Deputado com ideias avançadas propõe a liberação de casamento civil entre heterossexuais.” – diz o apresentador. “- Então agora é assim: somos obrigados a compactuar com a imoralidade em rede nacional?” – questiona uma das mulheres. Enquanto isso, em uma escola qualquer, um aluno, desesperado, recorre ao possível bom senso de sua docente: “- Eu não sei por onde começar professora; pensei em falar com meus dois pais, porém, falta-me coragem. Papai e papai são extremamente conservadores, uma confissão assim poria em risco a saúde de um deles, que já é muito frágil. Sinto-me aprisionado dentro de mim mesmo por não poder ser o que realmente sou: heterossexual” – enfatiza o adolescente. A professora, em sua falta de tato e conhecimento para lidar com a questão, busca uma explicação, e, sem resposta, recorre à religião: “Menino, você precisa buscar ajuda espiritual; esta tua atração pelo sexo oposto fere as leis divinas e destrói o cerne familiar entre os iguais. Busque entendimento na Umbanda”. E, nesta mesma escola, durante uma aula de História, uma aluna fica indignada com a sociedade escravista do século XIX, que mantinha em cativeiros homens, mulheres e crianças brancas, consideradas sem alma. E a professora acrescenta: “- Até hoje ainda vemos resquícios dessa herança feudal; os brancos ainda sofrem o peso das chibatas em seus subempregos; ainda são enxovalhados por piadas racistas que o diminuem e aumentam sua revolta frente à sociedade negra, orgulhosa em sua supremacia, inquebrantável dentro de suas religiões originárias da Grande África - o berço da civilização.” Em outra ocasião, durante um debate sobre as diferenças culturais entre as diferentes regiões do Brasil, a professora, consternada, fala o quão triste é constatar que, em tempos tão avançados, o extremo norte do Brasil, com seus nordestinos burgueses e sua cultura africana, ainda fere o seu extremo sul com suas pilhérias; pobres sulistas que carregam um fardo por terem nascido na região mais pobre de seu país, que não tiveram as mesmas oportunidades que seus irmãos de pátria; são apenas os “branquelos aguados e desnutridos” do subdesenvolvimento e do esquecimento político, escondidos em suas pseudo-religiões, herança europeia, este continente tão maltratado e subalternizado por séculos. E no dia-a-dia tudo é igual: pessoas fingem que entendem, e quem entende não se importa, porque a omissão é menos cansativa. E se? Sendo assim, inverta o que, aparentemente, não tem entendimento, e reflita.
           
Éd Brambilla. Crônica. INVERSÃO PARA REFLEXÃO. 03/02/2013.

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