ALMa RaBiScAdA

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

A B u S c A

A Moça, que antes aceitava viver de migalhas, tem hoje necessidade de mesa farta. Não quer mais nem menos. Quer a proporção do equilíbrio perfeito. O fato é que ela andara mergulhada em alguns sonhos que lhe arrepiaram a alma. Experimentara a mais pura essência do sentimento de solidão. A sensação era a de que um feixe de luz amarelado - a solidão é de um amarelo nauseante - lhe perfurasse o peito com o propósito de atingir-lhe o coração. E se o destino era o coração, o objetivo maior era a mente. Acordara de sobressalto, enjoada. Mas logo recuperou a consciência da realidade que, nestas ocasiões, costuma socorrê-la. Este fato trouxera à moça uma constatação: nem sempre a meta do sonho é a perfeição daquilo que é idealizado. Muitas vezes tem o sonho a missão de mostrar o caminho certo para os sentimentos e atitudes. É um direcionamento necessário. É como se nestes momentos o sonho viesse para mostrar o distanciamento da própria verdade e a invasão da verdade de outrem. E quando há a invasão de terreno alheio, aflora o distanciamento da própria percepção e passa-se a perceber o muito que é o externo, e o interno fica de uma pequenez miserável. É aí que a solidão encontra brecha e se instala. Solidão é ausência de sonhos próprios. Ela passara muito tempo sem saber que era especialmente necessária. Até aquele momento, só havia experimentado sensações de amor, prazer e autoconfiança de maneira superficial. Eram sentimentos mergulhados no vazio.  E mais uma vez o fio condutor que promove o crescimento humano precisou intervir. Decidira então que lutaria para que a grande mulher escondida em suas entranhas se libertasse do sono profundo. Ela gostava de viver. Só não tinha o dom da paciência. Tudo precisava acontecer no momento primeiro. E isso a deixava envolta a uma resignação parecida com a sina de um condenado que vai à forca e, cada segundo, transforma-se em uma eternidade. E quando no último instante o condenado é declarado inocente, um sentimento de repulsa e ódio devasta cada centímetro de sua alma. Fizeram-no sofrer impiedosamente por longo período e, quando estava pronto para o momento final, devolveram-lhe a vida, que, para ele, não tinha mais valor. E agora? O que um ex-condenado faz com uma vida que precisou diluir e transformar em resignação? Era exatamente este drama que, por muito tempo, atormentara a essência da Moça. E qual seria a melhor maneira para libertar-se deste flagelo sem que a repulsa e o ódio tomassem conta de sua alma? Era esta a grande pergunta que fazia a si mesma. E se ainda conseguia ter este raciocínio, era um sinal de que havia uma fresta de esperança para sua salvação. E assim como um feixe de luz possui a magia de passar por entre frestas, também a Moça se valeu de sua magia interior para penetrar na pequena fresta que a levaria para dentro de suas verdades. E qual seria a ordem de importância para cada uma de suas verdades? Ela estava no caminho certo, porém, sua primeira verdade dizia que seria necessário chamar a atenção daqueles que a amavam em vez de pedir socorro. Não atinou que poderia perfeitamente entrar pela fresta em pé, de cabeça em prumo. Entrara de cabeça para baixo. E isso lhe causara muita dor e sofrimento. Tentara o suicídio. Foi, para ela, um sentimento de melodia grave, visto que tal atitude embasava-se apenas no grito de socorro. A consumação do ato era apenas uma ideia. E como todo ato tem suas implicações, há os que entendem o pedido de ajuda, mas também há os que preferem o discurso da crítica destrutiva. Mas foi em uma clínica, em meio a pessoas com os mesmos problemas d’alma que a Moça encontrou a ponta da corda. Com o amor e carinho de pessoas que lhe são vitais, reencontrou, aos poucos, o caminho para a reconstrução de sua verdadeira essência altruísta e perseverante, superando, então, esta passagem por entre espinhos, com os pés descalços. Eis que agora a moça está pronta, mas tem consciência de que cada dia a renovação se faz necessária. 

A vida

A vida:
Tem dia que é lua
Tem dia que é sol
Tem dia que tudo se mistura
E nos captura... Nos devora
Mas depois nos devolve a loucura:
De amar, de sonhar e de acreditar
Tem dia que nada acontece
Tem dia que é tudo de uma vez e,
Pequenos que somos, nos retraímos
Depois sentimos e ressentimos
Novamente descobrimos e redescobrimos:
Estamos vivos e vívidos
Prontos novamente, intrinsecamente abertos
Um ponto, um novo encontro
Um reencontro, uma centelha
A vida se fazendo, se mostrando
A vida se refazendo, se desmontando
A vida se reconstruindo
E assim vivemos
Porque queremos o objetivo final:
A felicidade, o amor e a satisfação
E tudo isso para dizer que a vida
É dentro de cada um de nós
É cada palavra que dizemos
É o sorriso que damos incondicionalmente
É a fé que pregamos
É cada momento que vivemos
Sem nos preocuparmos com convenções e invenções
É o nosso coração em paz e harmonia com o Todo
E o Todo para nos lembrar
Que cada um de nós é peça única e rara
No imenso quebra-cabeça chamado VIDA


A uma eterna amiga... Ela precisou redescobrir a vida.


Éd Brambilla. CONTO. A BUSCA. Setembro de 2009.

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